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ARTIGO
GRAPHPRINT OUT/10
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Valores Made in Japan
Por *Antônio Furlan
Uma das maiores riquezas da humanidade é sua capacidade de
se reinventar e assimilar novos conceitos. Nada é estanque nessa
sociedade e o que ontem era inconcebível hoje é o único cami-
nho viável. Um exemplo imbatível e simples dessa mudança de
hábitos é o gosto do brasileiro pela culinária japonesa. Os sushis
e sashimis, olhados com desdém pela grande maioria da popula-
ção há pouquíssimos anos, hoje não apenas agradam ao paladar
nativo como tornaram-se populares a ponto de conviverem paci-
ficamente ao lado de hambúrgueres e pratos feitos em praças de
alimentação dos shoppings brasileiros.
A questão da comida japonesa é apenas a ponta do iceberg no que
se refere aos valores made in Japão. O Japão é um dos países que
mais suscitam curiosidade sobre a força da sua economia. Lá, a
cultura milenar convive com a sofisticação da produção, desenvol-
vida pelo próprio esforço de pesquisa e inovação das empresas.
Assim, essas companhias tornaram-se competitivas em vários
setores de atividade, sobretudo nos segmentos de automóveis,
produtos eletrônicos e equipamentos para impressão. Mas como
um país que era visto como produtor de descartáveis tornou-se
um gerador de tecnologia de ponta?
Para os japoneses há três valores que são considerados o tripé
de sustentação da sociedade: o conceito de pátria, ligado ao na-
cionalismo fervoroso; o conceito de família, que é decorrente do
primeiro valor: a pátria só existe por causa da família; e o terceiro
valor,  o trabalho, que faz a ponte entre os dois primeiros valores e
é base do modelo gerencial japonês. Por isso, naquele país, traba-
lho e empresa fazem parte do mesmo valor cultural.
Ao ter sua economia destruída ao final da 2ª Guerra Mundial, com
grande parte do seu parque industrial em ruínas, o Japão enfren-
tou o seu maior desafio: reconstruir a nação, sempre com base nos
valores de sua sociedade. Mas até os primeiros anos da década de
1950, os produtos da indústria japonesa não tinham boa qualidade
e, por isso não eram bem aceitos para exportação.
Nessa época, um especialista em estatística do Departamento
de Recenseamento dos Estados Unidos, Edwards Deming (1900-
1993), deu o pontapé inicial em um processo que vigora até nos-
sos dias. Ele foi o agente que estabeleceu um divisor de águas
na história da gestão japonesa. Segundo ele “(...) a qualidade dos
bens de consumo japoneses tinha granjeado, no mundo todo, uma
fama negativa, de produtos mal feitos e baratos. (...)”
Mas a partir de 1954 essa economia começou a ganhar merca-
dos. As lições de gestão imputadas por Deming mostraram que
qualidade era vital para a exportação e que eles poderiam em-
preender a mudança. As administrações e os operários das fá-
bricas somaram seus esforços para conseguir qualidade e criar
empregos. O resultado de todo esse empenho está nas vitrines
do mundo. É só olhar em volta –  dentro de nossas próprias ca-
sas e do escritório – para notar que o resultado desse movimento
nacionalista japonês está sedimentado. Aparelhos de tevê, ele-
trodomésticos, celulares, eletroeletrônicos, carros e até equi-
pamentos gráficos  são japoneses. Eles provaram que não só
podem fabricar produtos tão bons quanto os europeus ou ame-
ricanos como estão aptos a aprimorar tecnologias anteriores.
E a globalização nos trouxe de bandeja uma oportunidade única
para promover um open mind. Todos com mais de 35 anos já ou-
viram – pelo menos uma vez na vida – a célebre frase “carro bom
é carro alemão”. Se algum dia isso foi verdade, hoje não é mais.
E não cabe aqui nenhuma depreciação à indústria automobilística
alemã. A questão é que esses conceitos, outrora restritivos, foram
ampliados e o mundo está desmitificando tais verdades absolutas.
A Alemanha tem uma indústria automobilística de ponta, mas Co-
reia e Japão também têm.
Da mesma forma, em nosso setor, as marcas japonesas de equipa-
mentos de impressão e acabamento já são recebidas como sinô-
nimo de qualidade e durabilidade. Estamos em plena era nipônica,
por assim dizer. As gráficas que buscam modernidade não deixam
de analisar as vantagens de se adquirir uma máquina com con-
ceitos made in Japan. A tecnologia japonesa fincou bandeira em
segmentos impensáveis na história recente da economia e está
provando – por a mais bê – que os nipofóbicos estão fora de moda,
seja na escolha do cardápio, seja para comprar tecnologia.
*Responsável pela linha de equipamentos Ryobi para a Ferrostaal