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ARTIGO
GRAPHPRINT NOV/10
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O primeiro semestre deste ano foi marcado
pelo lançamento de uma novidade tecnoló-
gica ansiosamente aguardada: o “livro virtu-
al”, o iPad. E tenho notado, em meus conta-
tos com os gráficos – sejam eles brasileiros,
da América Latina, América do Norte, Europa
ou Ásia – a inquietação constante: poderão
a internet e, mais recentemente, o lança-
mento do iPad, de alguma forma, prejudicar
o produto impresso?
No passado, sempre que uma nova tecnolo-
gia era desenvolvida, os pessimistas alarde-
avam que ela iria “matar” algo relacionado.
Foi assim com a chegada da televisão, que
iria liquidar o rádio e o cinema, e os dois es-
tão aí, mais fortes e dinâmicos do que nunca.
Ambos os veículos souberam se reinventar,
trazendo ao público aquele “mais” que torna
um produto especialmente atrativo.
No caso do cinema, grandes sucessos de bi-
lheteria sucedem-se temporada após tem-
porada. “Avatar”, lançado no começo deste
ano, já arrecadou mais de dois bilhões de
dólares no mundo todo. Nada mau para uma
mídia destinada a “morrer”... James Came-
ron soube utilizar a tecnologia, no caso a fil-
magem em “3D”, para arrastar aos cinemas
multidões de espectadores que se encanta-
ram com a criatividade do diretor.
Nos livros, títulos da série “Harry Potter” e
“Crepúsculo” vendem milhões de exem-
plares para um público adolescente que já
cresceu num mundo digital. Prova de que,
com criatividade e talento, o consumidor
sempre é fisgado e lança-se com prazer ao
que sente que acrescenta algo à sua sensi-
bilidade, à sua vida.
As novidades, como o caso do iPad, podem
até assustar no momento em que são lan-
çadas, pois vêm com todo aparato da mídia
mundial. Depois que a poeira baixa, perce-
bemos que é apenas mais um veículo para
os leitores, e que, como qualquer produto,
encontrará usuários, sem, contudo, ameaçar
os setores já existentes.
Vejamos o que disse Juergen Boos, diretor da
Feira do Livro de Frankfurt (revista Dinheiro
nº 652): “O livro eletrônico e a internet são
Inovação é oportunidade, não “risco”
*Por Dieter Brandt
uma grande oportunidade, e não uma amea-
ça às editoras. Na verdade, as editoras estão
prestes a viver uma nova era de ouro.” Essa
afirmação, vinda do diretor do maior even-
to do mundo para o setor editorial, merece
uma reflexão a respeito desse assunto que
tanto tem incomodado profissionais ligados
ao mercado gráfico do mundo inteiro.
O grande ensaísta e escritor Umberto Eco,
autor do sucesso “O nome da rosa” e pro-
fessor emérito da Universidade de Bolo-
nha, na Itália, concedeu, em março deste
ano, uma entrevista ao jornal O Estado de
S.Paulo na qual falou sobre seu novo lança-
mento, “Não contem com o fim do livro”: “O
desaparecimento do livro é uma obsessão
de jornalistas, que me perguntam isso há
15 anos. O livro ainda é o meio mais fácil
de transportar informação. Os eletrônicos
chegaram, mas percebemos que sua vida
útil não passa de dez anos. E, ao contrário,
temos livros que sobrevivem há mais de cin-
co séculos. Conversei recentemente com o
diretor da Biblioteca Nacional de Paris, que
me disse ter escaneado praticamente todo o
seu acervo, mas manteve o original em pa-
pel, como medida de segurança.”
Outra preocupação pertinente no tocante ao
avanço das mídias digitais no campo da in-
formação diz respeito à qualidade dos con-
teúdos produzidos e armazenados. Mega-
empresas digitais, como a Apple e o Google,
cresceram tanto, e com tantas ramificações,
que não seria exagero afirmar que nos tor-
namos quase reféns desses conglomerados,
e que estes podem, se assim o desejarem,
manipular as informações de acordo com
seus interesses. Outra desvantagem é que,
ao consultar sites de busca, como o Goo-
gle e o Yahoo, a informação flui como uma
cascata, sem qualquer filtro. Dessa forma,
informações verídicas são misturadas a
todo tipo de “lixo” digital. O mesmo pode-
mos dizer de nossas caixas de e-mail, onde,
ao lado de mensagens importantes, figuram
propagandas de todo tipo, vírus e mensa-
gens exdrúxulas, que temos de limpar cons-
tantemente.
É aí que entra a credibilidade do produto
impresso. Ao comprar uma revista ou um
jornal, por exemplo, temos a certeza de que
ele foi feito por profissionais experientes e
preparados. Sabemos, de antemão, que as
informações ali reunidas passaram por um
crivo que as torna mais confiáveis. E o con-
sumidor busca sempre isso: credibilidade e
confiança. Um aluno que for fazer uma pes-
quisa escolar sobre um assunto específico,
como o Império Romano, certamente terá
acesso a dados mais consistentes se con-
sultar a Enciclopédia Britânica do que se
confiar na interativa Wikipédia.
As editoras, embora já se preparem para o
livro digital, afirmam que o produto impresso
jamais será desbancado. O próprio mercado
se encarregará de nivelar as novas tecnolo-
gias e o consumidor, afinal, é quem vai deci-
dir. Neste momento torna-se muito importan-
te que o empresário tenha a visão de buscar
sempre o melhor para seu público, porque
essa é a grande diferença, o que define o fu-
turo de uma empresa e o seu sucesso.
No setor gráfico, há segmentos em que o va-
lor do impresso cresce de maneira constan-
te. Exemplos disso são a indústria de cos-
méticos, em que a sedução exercida pela
embalagem é fator determinante na hora da
compra, e a alimentícia, que também tem
nas embalagens um grande aliado no sen-
tido de estimular a compra – além de uma
embalagem bem-feita ser essencial para a
conservação do produto. O setor farmacêu-
tico, então, é um dos que mais têm utilizado
os impressos e as novas tecnologias, inclu-
sive para a prevenção da pirataria, que tem
na falsificação de remédios uma de suas
maiores fontes de lucro.
O que tenho sempre recomendado aos meus
amigos gráficos é que façam o que sempre fi-
zeram – sobretudo aqueles que conseguiram
êxito em seus empreendimentos: arregacem
as mangas e procurem enxergar nas novas
tecnologias uma oportunidade de crescimen-
to. Agreguem valor ao seu negócio. Esse é o
caminho que conduz ao sucesso.
*Dieter Brandt é presidente da Heidelberg para a
América do Sul