Revista Graphprint - Edição 191

GRAPHPRINT Mai/Jun 2019 7 Vamos conversar sobre suas atividades junto à cadeira produti- va do livro. Você dorme? Durmo. A qualidade do sono é que não é das melhores. Depois do acidente de bike em 2018, acordo a cada duas horas para pingar um colírio alucinógeno, que me deixa mais agitado ainda. Sou tri- polar nível três e com o “aditivo” atravesso paredes. Acordo cedo, antes do galo que acorda as galinhas. Além de presidente da Scor- tecci, que me ocupa muito, sou diretor setorial da Abigraf, editor do portal Amigos do Livro, conselheiro de várias entidades do li- vro e, agora, vice-presidente diretivo da Associação Brasileira de Tecnologia Gráfica. Nas horas ocupadas sou ainda perito técnico, palestrante e consultor editorial e gráfico. O tempo que me sobra costumo pedalar pela cidade de São Paulo e assistir aos jogos de futebol do Fortaleza e do Palmeiras, times do coração. Meu amor pelos livros é dimensional. Não é fácil ser escritor, editor, gráfico e livreiro: tudo ao mesmo tempo. Eu e meus heterônimos formamos um bom time. Não há disputa entre as partes interessadas. Como anda o mercado de livros no Brasil, depois dos pedidos de recuperação judicial das livrarias Cultura e Saraiva? Um caos. O negócio do livro atravessa sua maior crise. Em 12 anos, segundo números da FIPE, encolhemos 25%. Existe algo de bom nessa desgraça toda: paramos de “encolher” e o setor resolveu tirar o traseiro da cadeira. O comodismo mata e nos torna “inertes” além da conta. Vejo duas crises: uma sistêmica que assola o país desde 2013 - a tal crise Brasil - e outra pontual e previsível, com os pedidos de recuperação judicial das duas maiores redes do país. A crise não é do livro. As pessoas continuam lendo e apaixonadas por livros. A crise Brasil - essa sim - é preocupante. A economia precisa voltar, o quanto antes, ao círculo virtuoso do crescimen- to. Sobre a crise no negócio do livro, vejo forte movimentação do setor, principalmente por parte das entidades do livro. Isso é mui- to bom. Alguns pontos são fundamentais para a sua recuperação: busca por um preço justo do produto livro, capaz de remunerar todos os agentes da cadeia produtiva, e descentralização do varejo, através do surgimento de novas livrarias, menores e segmentadas. Acho que o negócio da distribuição de livros através do modelo da consignação precisa ser refundado com novas práticas comerciais, transparência e boa gestão. É o desafio. Esse negócio de “guerra de descontos” não é saudável para o setor. As principais entidades do livro estão atentas e ligadas em busca de uma solução compar- tilhada para todos os agentes da cadeia. Por fim, cabe aqui dizer, sou favorável à aprovação da lei do preço único, que tramita no Congresso desde 2017. O que você quis dizer com “uma crise previsível” e mais ainda sobre ser a favor da lei do preço único para os livros? Previsível. Era um desastre anunciado! As duas redes - Cultura e Saraiva - vinham, desde 2017, atrasando pagamentos e sufocan- do o mercado com prazos cada vez maiores. As editoras perderam capital de giro e, infelizmente, muitas acabaram fechando suas portas. Isso trouxe ao setor o que chamamos de “efeito dominó”, atingindo gráficas, distribuidoras e fornecedores de insumos. Não precisa ser esperto para saber que eram bombas-relógio. As duas redes, juntas, representavam, para a grande maioria, 40% de su- as vendas no varejo. Poucas editoras se prepararam para o dia D, diversificando vendas e abrindo novos canais de comercialização, que veio na virada do ano, no melhor das festas, que são as vendas de Natal e de fim de ano. Sobre a lei do preço único, penso na regulação do varejo - importante para o setor, no equilíbrio da cadeia, na diversidade de títulos e na concorrência mais justa entre as redes e as livrarias independentes. O que você acha que vai acontecer com as duas redes de livrarias? Scortecci: Vão sobreviver - é o que o mercado aposta. Precisarão ajustar suas estruturas, melhorar a relação com as editoras, ter mais transparência, perseguir a boa gestão e acabar de vez com a prática predatória dos descontos, que nada contribui para a saúde do setor. O mercado editorial foi generoso com elas, aprovando suas pro- postas de recuperação e fornecendo livros, ininterruptamente. Já tivemos nos últimos anos profecias sobre o fim do livro impresso. Um dia, quem sabe. Quem vai decidir o futuro - sua conveniência ou não - serão os leitores de livros. Até lá, façamos a nossa parte. “O negócio do livro atravessa sua maior crise. Em 12 anos, segundo números da FIPE, encolhemos 25%. Existe algo de bom nessa desgraça toda: paramos de “encolher” e o setor resolveu tirar o traseiro da cadeira.” “A economia precisa voltar, o quanto antes, ao círculo virtuoso do crescimento. Sobre a crise no negócio do livro, vejo forte movimentação do setor, principalmente por parte das entidades do livro. Isso é muito bom.”

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